sexta-feira, novembro 17, 2023


 

 SOBRE A PALESTINA. 

LEIA O MATERIAL DA FOB 


https://lutafob.org/contra-a-invasao-de-israel-defender-a-vida-do-povo-da-palestina/

quinta-feira, janeiro 05, 2023

Voltando

depois de uma década o Blog vai voltando....

segunda-feira, novembro 29, 2010

O jornalismo desonesto e o mito do “crime organizado”

O jornalismo desonesto e o mito do “crime organizado”

Por Gustavo Barreto em 25/11/2010 Retirado de www.consciencia.net

Atualizado em 25/11/2010 – 14h29

O “Jornal da Globo” fechou com chave de ouro o dia de uma emissora empenhada em assustar e desinformar o público, enquanto outras emissoras e rádios acompanharam a tática do pânico. A velha técnica do “Mantenham a calma” seguido de imagens impactantes da violência no Rio de Janeiro é a melhor forma, do ponto de vista da cultura do medo que tenta se impor, de pôr em ação esse objetivo. É como você dizer “Fique à vontade” quando recebe alguém pouco conhecido em sua casa, provocando o efeito contrário. Neste caso é bem pior: trata-se do imaginário social de um conjunto de milhões de brasileiros que está em jogo. E neste caso há consequências políticas.

Não há dúvidas de que (1) o índice de criminalidade no Rio é muito alto, inaceitável, e que (2) a lógica que rege o projeto da polícia comunitária, que esse governo chama da “UPP” e que outros governos já tentaram com outros nomes, é um bom caminho, desde que proponha de fato a participação da comunidade no processo decisório e que seja mais amplo. Atualmente é um conjunto de projetos-piloto.

No entanto, estratégias diversas estão em jogo. A saber:

A. O Governo do Estado, principalmente por meio do governador Sergio Cabral, tenta capitalizar a crise politicamente. Aparece como o “líder destemido” que as pessoas assustadas das classes A e B exigem nessa hora. Ao mesmo tempo, desvia a atenção da plena incompetência do governo nas áreas de educação e saúde – incluindo a recente busca e apreensão na casa de Cesar Romero, o ex-subsecretário-executivo de Saúde, primo da mulher do secretário Sérgio Côrtes e braço direito dele na secretaria. A acusação: fraude em licitação ao contratar manutenção de ambulâncias superfaturada em mais de 1.000%;

B. Setores mais violentos da Polícia Militar – a banda podre que não quer saber de papo de UPP – ganham carta branca, por conta do clima de medo, para fazer suas velhas e conhecidas “incursões” nas favelas, a política burra do confronto com o “crime organizado”, vitimando cidadãos inocentes e realizando execuções sumárias de suspeitos. O Secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, chama isso de “efeito colateral”, enquanto jornalistas passam uma coletiva de imprensa inteira perguntando apenas por “números” e trajetos da PM e do BOPE;

C. Os principais chefes da Polícia Militar do Rio de Janeiro e a Secretaria de Segurança Pública vendem a tese deplorável de que os atentados são uma “reação às políticas das UPPs”, e a velha mídia simplesmente engole. O curioso é que as UPPs estão presentes em 13 favelas, de um universo de 1.000 existentes no Rio e região metropolitana. Imagina quando chegarem a 20, 30! Melhor mudar para Miami de uma vez;

D. A mídia cria uma dinâmica do medo a partir de absurdos sociológicos, como afirmar que o “crime organizado” atual surgiu do encontro entre presos comuns e presos políticos nos anos 70 (tentando vincular militantes de esquerda a traficantes de drogas); separar a cidade em esquemas tipos “eles-nós”, como fez Arnaldo Jabor, ao afirmar que “é preciso apoio da população, principalmente da Zona Sul, pois a periferia já mora dentro da violência” (JG, 24/11/2010) e até mesmo mentir descaradamente, afirmando por exemplo que os “índices de criminalidade estão estagnados no Rio” (editorial de William Waack), o que é mentira, conforme atesta até mesmo um dos maiores críticos do Governo do Estado, o sociólogo Ignácio Cano. Pouco importa para o jornalismo desonesto: o que está em questão é reafirmar o discurso vazio do “A que ponto chegamos!” e o elogio ao “endurecimento” das leis e das ações vingativas, como forma de alívio do medo criado. Não adianta nada, conforme apontou este seminário (em especial a fala do Coordenador do Núcleo de Presos da Polinter no Estado do Rio de Janeiro, o delegado da Polícia Civil, Orlando Zaccone).

A "polícia comunitária" do Rio de Janeiro, conhecida como UPP, tem coincidentemente um caminho parecido com o das rotas dos grandes eventos internacionais que se aproximam.

A "polícia comunitária" do Rio de Janeiro, conhecida como UPP, tem coincidentemente um caminho parecido com o das rotas dos grandes eventos internacionais que se aproximam.

Os interesses, portanto, são complexos tal como os nossos problemas. A Zona Sul (parte dela, aquela à qual o Jabor se refere e da qual faz parte) está tão assustada que não consegue raciocinar. Milhares de pessoas são executadas todo ano no Rio de Janeiro, dados absolutamente grotescos. A cobertura é a mesma? Não. “As pessoas lidam com insegurança no Rio de forma cíclica e dramática. Para conviver com o alto nível de violência na cidade, tratam como se ela não existisse. Mas, então, surge um evento de grande repercussão e vira uma pauta central na cidade, todos discutem, é uma grande catarse”, aponta Ignácio Cano. “Sensação de segurança pública é muito diferente da efetiva segurança”, completa o deputado Marcelo Freixo.

Se fosse de fato uma preocupação, pararia para ler o relatório da CPI das Milícias, concluído no dia 10 de dezembro de 2008. Contém o mapa das milícias, seu funcionamento, seus braços econômicos, a relação do braço político com o braço econômico e o domínio de território. Enquanto as Nações Unidas calculam que o narcotráfico rende 200 mil dólares por minuto, só no domínio das vans no Rio de Janeiro, uma das milícias faturava 170 mil reais por dia. Este é apenas um exemplo.

Crime organizado, portanto, é isso: um negócio bem organizado. O que torna o crime “organizado” é sua capacidade de se organizar, e não de reagir violentamente. “Em qualquer lugar do mundo, o crime organizado está sempre dentro do Estado, e não fora”, aponta o deputado Marcelo Freixo, que relata sua dificuldade quando tentou instituir a referida CPI neste depoimento.

O pior é que o número de milícias é, hoje, maior do que em 2008. “O número de territórios dominados por milícias hoje é maior do que o número de territórios dominados pelo varejo da droga”, comenta Freixo. “Eu estranho o silêncio desse governo em relação às milícias, dizendo que o Rio está pacificado, diante do crescimento das milícias”.

E o poder público tampouco ajuda. O relatório foi entregue pelos membros da CPI nas mãos do prefeito Eduardo Paes. Solicitaram, por exemplo, que a licitação das vans fosse feita individualmente e não por cooperativas. “O prefeito acaba de fazer licitação por cooperativas e não individualmente”, denunciou Freixo.

Outro fator que aponta o descaso do poder público é o descaso com os serviços sociais que deveriam acompanhar o processo de “pacificação”. “Eu estive no Chapéu Mangueira e na Babilônia. Além da polícia, não há lá qualquer braço do Estado. A creche mal funciona, com o salário atrasado das professoras, o que a Prefeitura não assume. O posto de saúde não tem nenhum médico, nenhum dentista da rede pública do Estado. É mais uma vez a lógica exclusiva da polícia nas favelas – e somente a polícia”, afirmou. O projeto das UPPs está traçando um caminho bem delimitado: setor hoteleiro da Zona Sul, entorno do Maracanã, Zona Portuária e a Cidade de Deus, “única área dominada pelo tráfico em toda Jacarepaguá, que tem o domínio hegemônico das milícias”.

Danem-se as demais regiões que, como ressaltou Jabor, “já moram dentro da violência”.

Uma questão social, de classe

Para quem ainda acha que as questões de classe acabaram, basta comparar a forma como os diversos crimes em nossa sociedade são enfrentados. Para combater crimes financeiros (quando se combate), ninguém entra em agências bancárias rendendo as pessoas e atirando. Nas favelas, áreas com assentamentos humanos extremamente degradados, é diferente.

Um dos “efeitos colaterais”, na expressão de Beltrame, é a estudante Rosângela Alves, de 14 anos. Seu pai Roberto Alves, ironizou a presença dos policiais militares na unidade de saúde com aplausos: “Parabéns a vocês. Parabéns, Beltrame, parabéns, Cabral. Olha o que vocês conseguiram com isso! Matar uma menina que estava em casa! Sabe o que vocês conseguem com essas operações: matar pobres”. Sem conseguir sair de casa por causa do intenso tiroteio, a mãe da menina, Thereza Cristina Barbosa, acusou em relato ao jornal O Dia a polícia de ter disparado o tiro que matou sua filha. “O tiro que atingiu minha casa partiu de baixo para cima. Minha filha está morta, e eu sequer consigo velar o corpo dela”, lamentou ela, por telefone. (Leia aqui e aqui)

Como já apontei, o narcotráfico é um negócio como qualquer outro. E rende bastante: dados conservadores das Nações Unidas estimam que o rendimento líquido é de US$ 400 bilhões ano. Um “freela” para se queimar um carro custa entre R$ 200 e R$ 400. “Falo em ‘varejo de drogas’ na favela, e não de traficantes”, reafirma Freixo, apontando que a ponta do sistema – o 1% que está na favela – não tem projeto de poder e qualquer noção de organização criminal, como apontei. “Nunca participaram de juventude católica, de grêmio estudantil, nunca tiveram qualquer noção de coletividade. Sabe quantas escolas públicas existem no Complexo do Alemão? Duas”.

Conforme afirmou até mesmo um capitão e um dos fundadores do Batalhão de Operações Especiais (BOPE) – um grupo de policiais fascistas que acreditam que executar sumariamente é uma prática normal, conforme não escondem mesmo em declarações públicas – em uma entrevista hoje (25/11) pela manhã na TV Record: “Os Batalhões da PM não possuem estrutura mínima de inteligência para operar”.

Marcelo Freixo, deputado que trata da segurança há muito tempo, amplia a crítica e denuncia: "Sabe quantas escolas públicas existem no Complexo do Alemão? Duas"

Marcelo Freixo, deputado que trata da segurança há muito tempo, amplia a crítica e denuncia: "Sabe quantas escolas públicas existem no Complexo do Alemão? Duas"

O deputado Marcelo Freixo deu uma entrevista nesta quinta-feira (25/11) na GloboNews afirmando o óbvio: o número de pessoas portando fuzis não chega a 1% dos moradores. Ele costuma ironizar: “Eu gostaria que no parlamento fosse a mesma coisa: menos de 1% envolvido com o crime. Infelizmente não é assim, mas na favela é”. A polícia tem que agir com responsabilidade diante destes cidadãos. Enquanto isso telespectadores igualmente fascistas comentam pela internet: “Tem que entrar mesmo e enfrentá-los”. De quem estamos falando?

Freixo, focado na solução do problema, lembra: “Armas não são produzidas nas favelas. Eles vieram de algum lugar. Quantas ações policiais foram feitas na Baía de Guanabara? Quantas foram realizadas no Porto? Eu não me lembro de nenhuma”. É uma constatação que deixa todos os “notáveis” comentadores políticos envergonhados, pois só sabem falar abobrinhas sobre a “coragem” dos policiais em “enfrentar” o crime organizado. Estão focados na política burra do confronto.

Freixo lembrou ainda, na entrevista de hoje, que essas áreas pertencem ao tráfico de drogas. A área das milícias, conforme descrito anteriormente neste artigo, não foram tocadas – e tão somente por isso não estão reagindo. “Vamos lembrar que esses eventos já aconteceram próximo ao réveillon de 2006. O problema não é esse. A questão é que o setor de inteligência no Rio de Janeiro é muito falho. Para constatar isso basta visitar a DRACO [Delegacia de Repressão ao Crime Organizado da Polícia Civil do Rio de Janeiro]”, concluiu Freixo.

Agora, muito pertinentemente alguém poderia se perguntar: e os movimentos sociais nisso tudo? Eles não possuem meios para se comunicar, portanto não fazem parte do cenário político. É tão simples quanto é trágico.

Entrevista com HELIO LUIZ


Hélio Luz, radicado em Porto Alegre, sua cidade natal e onde residem familiares, o ex-chefe de polícia do Rio de Janeiro (de 1995 a 1997, durante o governo de Marcello Alencar) Hélio Luz acompanha com interesse a situação do Rio. Delegado aposentado, Luz dirigia a Polícia Civil do Rio quando agentes prenderam o traficante Marcio Nepomucemo, o Marcinho VP, apontado como um dos líderes do tráfico no Complexo do Alemão – para onde fugiram bandidos armados expulsos da Vila Cruzeiro, na última quinta-feira.

A reportagem e a entrevista é de Carlos Etchichury e publicada pelo jornal Zero Hora, 28-11-2010.

A imagem de jovens esfarrapados, armados com fuzis, escopetas, metralhadoras e pistolas, não surpreende Hélio Luz.

– O Estado nunca teve uma política de segurança de médio ou longo prazo. O Estado sempre atuou com uma política de segurança imediata – diz.

Eis a entrevista.

Como funciona o comando do tráfico no Complexo do Alemão?

Ele é diferente das demais favelas. É preciso voltar no tempo. Um dos fundadores do Comando Vermelho (CV), Rogério Lemgruber, o Bagulhão, foi preso na Ilha Grande, na época da ditadura, e conviveu com presos políticos.

Qual a influência da convivência com os presos políticos?


Quando ele saiu da Ilha Grande, começou a se organizar e se juntou com outros líderes. Um deles era o Orlando Jogador, que era do Complexo do Alemão. O Comando Vermelho começou a tomar o espaço de outras favelas, mudando a relação com a comunidade. O pessoal que assumia não tinha respeito com a população, porque era de outra área. O Orlando Jogador cresceu naquela área até ser morto, em 1994. Em seu lugar, assumiu o Marcinho Nepomucemo, o Marcinho VP (Vila da Penha), que era o braço direito do Orlando. Ele era da comunidade, e isso fez toda diferença (mesmo preso, Marcinho VP continua dominando o Complexo do Alemão).

As imagens da Rede Globo o surpreendem?

É uma situação antiga. Esta formação não foi feita em dois anos, cinco anos. Ela foi feita ao longo de 30 anos. Eles conseguem se sustentar no Complexo do Alemão, diferentemente de outras áreas, porque são de lá. Eles conhecem bem o terreno e a comunidade. Mas eles não constituem exército, milícia, coisa nenhuma. É um bando de garotos que não têm nada na cabeça. O fato de eles fugirem juntos supõe algum nível de organização de enfrentamento. Mas não têm.

Qual foi o momento em que o Estado perdeu o controle da situação?

O Estado nunca teve uma política de segurança de longo prazo. Nem de médio prazo. O Estado sempre operou com política de segurança de resultados. Há duas causas para o que nós estamos vendo. Uma, mais remota, e mais grave, que é a questão social. Outra, mais próxima, é restrita à área de segurança.

A impressão é de que se trata de um grupo organizado.

Quando ocorre esta ação espetacular, você pensa que o Estado venceu e que nós estamos derrotando um inimigo. Mas eles não são inimigos do Estado, eles são integrantes do Estado, mas foram marginalizados. O Estado criou estes caras. É produto direto do que nós fizemos. Num nível mais direto da segurança é resultado da corrupção das polícias do Rio.

A polícia do Rio é corrupta como mostrou os filmes Tropa de Elite e Tropa de Elite II?

É muito mais. Se fosse como o filme, seria ótimo. O grande problema é quantas vezes estes garotos foram presos e soltos? Foram para delegacia e liberados? Nem fichados são. Por quê? Porque tem acerto. Eles existem pela permissividade da polícia. Além disso, há questões de fundo. Eles prendem estes 200 que nós vimos fugindo, mas vão colocar aonde? E os outros, sei lá, 20 mil que têm no complexo com a idade deles? Tem política para eles? Vai ser proporcionada uma vida decente para eles? Como será feita a manutenção da área ocupada?

Qual a opinião do senhor sobre as UPPs?

É interessante. Eu não entendo por que colocam recrutas para montar UPPs. Eles dizem que, na média, são uns 200 recrutas com um oficial. Nas 14 UPPs dá algo em torno de 2,8 mil recrutas, 3 mil recrutas. Então, 3 mil recrutas estão resolvendo a situação da criminalidade no Rio? Tem um contingente de 40 mil policiais, mais 10 mil na Polícia Civil, que não resolveram o problema da criminalidade. É isso que estão dizendo? Se é isso, estão confirmando que o problema é corrupção.

Qual a solução para o Rio?

Luz – É desconcentração de renda. Quem tem de dar palpite sobre a segurança no Rio é aquele professor de Pernambuco, o Mozart Neves (ex-reitor da Universidade Federal de Pernambuco, integrante do movimento Educação para Todos). O negócio é educação. Não tem saída.

O senhor já participou de grandes operações no Complexo do Alemão?


Já participei de operações, mas não de grandes operações. Não precisa. Claro que agora, com essa situação, são necessárias mobilizações. Mas os principais vagabundos do Rio foram presos sem dar um tiro. Tu prende o cara no asfalto.

Esta é a situação mais crítica do Rio?

Em 1994, havia 140 pessoas sequestradas no Rio. O problema era muito sério. Os empresários, na época, queriam sair do Rio. Eles faziam seguro com empresas americanas para ter segurança na cidade. Foi um período de caos. Acabou o sequestro no Rio. Por que acabou? Porque a polícia antissequestro parou de sequestrar.



Entrevista com HELIO LUIZ


Hélio Luz, radicado em Porto Alegre, sua cidade natal e onde residem familiares, o ex-chefe de polícia do Rio de Janeiro (de 1995 a 1997, durante o governo de Marcello Alencar) Hélio Luz acompanha com interesse a situação do Rio. Delegado aposentado, Luz dirigia a Polícia Civil do Rio quando agentes prenderam o traficante Marcio Nepomucemo, o Marcinho VP, apontado como um dos líderes do tráfico no Complexo do Alemão – para onde fugiram bandidos armados expulsos da Vila Cruzeiro, na última quinta-feira.

A reportagem e a entrevista é de Carlos Etchichury e publicada pelo jornal Zero Hora, 28-11-2010.

A imagem de jovens esfarrapados, armados com fuzis, escopetas, metralhadoras e pistolas, não surpreende Hélio Luz.

– O Estado nunca teve uma política de segurança de médio ou longo prazo. O Estado sempre atuou com uma política de segurança imediata – diz.

Eis a entrevista.

Como funciona o comando do tráfico no Complexo do Alemão?

Ele é diferente das demais favelas. É preciso voltar no tempo. Um dos fundadores do Comando Vermelho (CV), Rogério Lemgruber, o Bagulhão, foi preso na Ilha Grande, na época da ditadura, e conviveu com presos políticos.

Qual a influência da convivência com os presos políticos?


Quando ele saiu da Ilha Grande, começou a se organizar e se juntou com outros líderes. Um deles era o Orlando Jogador, que era do Complexo do Alemão. O Comando Vermelho começou a tomar o espaço de outras favelas, mudando a relação com a comunidade. O pessoal que assumia não tinha respeito com a população, porque era de outra área. O Orlando Jogador cresceu naquela área até ser morto, em 1994. Em seu lugar, assumiu o Marcinho Nepomucemo, o Marcinho VP (Vila da Penha), que era o braço direito do Orlando. Ele era da comunidade, e isso fez toda diferença (mesmo preso, Marcinho VP continua dominando o Complexo do Alemão).

As imagens da Rede Globo o surpreendem?

É uma situação antiga. Esta formação não foi feita em dois anos, cinco anos. Ela foi feita ao longo de 30 anos. Eles conseguem se sustentar no Complexo do Alemão, diferentemente de outras áreas, porque são de lá. Eles conhecem bem o terreno e a comunidade. Mas eles não constituem exército, milícia, coisa nenhuma. É um bando de garotos que não têm nada na cabeça. O fato de eles fugirem juntos supõe algum nível de organização de enfrentamento. Mas não têm.

Qual foi o momento em que o Estado perdeu o controle da situação?

O Estado nunca teve uma política de segurança de longo prazo. Nem de médio prazo. O Estado sempre operou com política de segurança de resultados. Há duas causas para o que nós estamos vendo. Uma, mais remota, e mais grave, que é a questão social. Outra, mais próxima, é restrita à área de segurança.

A impressão é de que se trata de um grupo organizado.

Quando ocorre esta ação espetacular, você pensa que o Estado venceu e que nós estamos derrotando um inimigo. Mas eles não são inimigos do Estado, eles são integrantes do Estado, mas foram marginalizados. O Estado criou estes caras. É produto direto do que nós fizemos. Num nível mais direto da segurança é resultado da corrupção das polícias do Rio.

A polícia do Rio é corrupta como mostrou os filmes Tropa de Elite e Tropa de Elite II?

É muito mais. Se fosse como o filme, seria ótimo. O grande problema é quantas vezes estes garotos foram presos e soltos? Foram para delegacia e liberados? Nem fichados são. Por quê? Porque tem acerto. Eles existem pela permissividade da polícia. Além disso, há questões de fundo. Eles prendem estes 200 que nós vimos fugindo, mas vão colocar aonde? E os outros, sei lá, 20 mil que têm no complexo com a idade deles? Tem política para eles? Vai ser proporcionada uma vida decente para eles? Como será feita a manutenção da área ocupada?

Qual a opinião do senhor sobre as UPPs?

É interessante. Eu não entendo por que colocam recrutas para montar UPPs. Eles dizem que, na média, são uns 200 recrutas com um oficial. Nas 14 UPPs dá algo em torno de 2,8 mil recrutas, 3 mil recrutas. Então, 3 mil recrutas estão resolvendo a situação da criminalidade no Rio? Tem um contingente de 40 mil policiais, mais 10 mil na Polícia Civil, que não resolveram o problema da criminalidade. É isso que estão dizendo? Se é isso, estão confirmando que o problema é corrupção.

Qual a solução para o Rio?

Luz – É desconcentração de renda. Quem tem de dar palpite sobre a segurança no Rio é aquele professor de Pernambuco, o Mozart Neves (ex-reitor da Universidade Federal de Pernambuco, integrante do movimento Educação para Todos). O negócio é educação. Não tem saída.

O senhor já participou de grandes operações no Complexo do Alemão?


Já participei de operações, mas não de grandes operações. Não precisa. Claro que agora, com essa situação, são necessárias mobilizações. Mas os principais vagabundos do Rio foram presos sem dar um tiro. Tu prende o cara no asfalto.

Esta é a situação mais crítica do Rio?

Em 1994, havia 140 pessoas sequestradas no Rio. O problema era muito sério. Os empresários, na época, queriam sair do Rio. Eles faziam seguro com empresas americanas para ter segurança na cidade. Foi um período de caos. Acabou o sequestro no Rio. Por que acabou? Porque a polícia antissequestro parou de sequestrar.



sábado, novembro 27, 2010

A Guerra do Rio – A farsa e a geopolítica do crime

Dr. José Cláudio Souza Alves
Sociólogo, Porfessor da UFRRJ - Seropédica, RJ - 25/11/2010
Retirado do Site www.cartacapital.com.br

Nós que sabemos que o “inimigo é outro”, na expressão padilhesca, não podemos acreditar na farsa que a mídia e a estrutura de poder dominante no Rio querem nos empurrar.
Achar que as várias operações criminosas que vem se abatendo sobre a Região Metropolitana nos últimos dias, fazem parte de uma guerra entre o bem, representado pelas forças publicas de segurança, e o mal, personificado pelos traficantes, é ignorar que nem mesmo a ficção do Tropa de Elite 2 consegue sustentar tal versão.
O processo de reconfiguração da geopolítica do crime no Rio de Janeiro vem ocorrendo nos últimos 5 anos.
De um lado Milícias, aliadas a uma das facções criminosas, do outro a facção criminosa que agora reage à perda da hegemonia.
Exemplifico. Em Vigário Geral a polícia sempre atuou matando membros de uma facção criminosa e, assim, favorecendo a invasão da facção rival de Parada de Lucas. Há 4 anos, o mesmo processo se deu. Unificadas, as duas favelas se pacificaram pela ausência de disputas. Posteriormente, o líder da facção hegemônica foi assassinado pela Milícia. Hoje, a Milícia aluga as duas favelas para a facção criminosa hegemônica.
Processos semelhantes a estes foram ocorrendo em várias favelas. Sabemos que as milícias não interromperam o tráfico de drogas, apenas o incluíram na listas dos seus negócios juntamente com gato net, transporte clandestino, distribuição de terras, venda de bujões de gás, venda de voto e venda de “segurança”.
Sabemos igualmente que as UPPs não terminaram com o tráfico e sim com os conflitos. O tráfico passa a ser operado por outros grupos: milicianos, facção hegemônica ou mesmo a facção que agora tenta impedir sua derrocada, dependendo dos acordos.
Estes acordos passam por miríades de variáveis: grupos políticos hegemônica na comunidade, acordos com associações de moradores, voto, montante de dinheiro destinado ao aparado que ocupa militarmente, etc.
Assim, ao invés de imitarmos a população estadunidense que deu apoio às tropas que invadiram o Iraque contra o inimigo Sadam Husein, e depois, viu a farsa da inexistência de nenhum dos motivos que levaram Bush a fazer tal atrocidade, devemos nos perguntar: qual é a verdadeira guerra que está ocorrendo?
Ela é simplesmente uma guerra pela hegemonia no cenário geopolítico do crime na Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
As ações ocorrem no eixo ferroviário Central do Brasil e Leopoldina, expressão da compressão de uma das facções criminosas para fora da Zona Sul, que vem sendo saneada, ao menos na imagem, para as Olimpíadas.
Justificar massacres, como o de 2007, nas vésperas dos Jogos Pan Americanos, no complexo do Alemão, no qual ficou comprovada, pelo laudo da equipe da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, a existência de várias execuções sumárias é apenas uma cortina de fumaça que nos faz sustentar uma guerra ao terror em nome de um terror maior ainda, porque oculto e hegemônico.
Ônibus e carros queimados, com pouquíssimas vítimas, são expressões simbólicas do desagrado da facção que perde sua hegemonia buscando um novo acordo, que permita sua sobrevivência, afinal, eles não querem destruir a relação com o mercado que o sustenta.
A farça da operação de guerra e seus inevitáveis mortos, muitos dos quais sem qualquer envolvimento com os blocos que disputam a hegemonia do crime no tabuleiro geopolítico do Grande Rio, serve apenas para nos fazer acreditar que ausência de conflitos é igual à paz e ausência de crime, sem perceber que a hegemonização do crime pela aliança de grupos criminosos, muitos diretamente envolvidos com o aparato policial, como a CPI das Milícias provou, perpetua nossa eterna desgraça: a de acreditar que o mal são os outros.
Deixamos de fazer assim as velhas e relevantes perguntas: qual é a atual política de segurança do Rio de Janeiro que convive com milicianos, facções criminosas hegemônicas e área pacificadas que permanecem operando o crime? Quem são os nomes por trás de toda esta cortina de fumaça, que faturam alto com bilhões gerados pelo tráfico, roubo, outras formas de crime, controles milicianos de áreas, venda de votos e pacificações para as Olimpíadas? Quem está por trás da produção midiática, suportando as tropas da execução sumária de pobres em favelas distantes da Zona Sul? Até quando seremos tratados como estadunidenses suportando a tropa do bem na farsa de uma guerra, na qual já estamos há tanto tempo, que nos faz esquecer que ela tem outra finalidade e não a hegemonia no controle do mercado do crime no Rio de Janeiro?
Mas não se preocupem, quando restar o Iraque arrasado sempre surgirá o mercado finaneiro, as empreiteiras e os grupos imobiliários a vender condomínios seguros nos Portos Maravilha da cidade.
Sempre sobrará a massa arrebanhada pela lógica da guerra ao terror, reduzida a baixos níveis de escolaridade e de renda que, somadas à classe média em desespero, elegerão seus algozes e o aplaudirão no desfile de 7 de setembro, quando o caveirão e o Bope passarem.


OUTRO TEXTO

A crise no Rio e o pastiche midiático, Luiz Eduardo Soares (www.luizeduardosoares.blogspot.com)



Observatório de Favelas: lógica de “guerra” é retrocesso

27 de novembro de 2010 às 12:20h

Em virtude dos últimos acontecimentos na região metropolitana do Rio de Janeiro, o Observatório de Favelas repudia todo e qualquer ato de violência, seja ele oriundo das organizações criminosas ou de instituições do Estado. Consideramos um retrocesso na política de segurança pública uma retomada da intervenção policial pautada pela lógica do confronto e pelo discurso da “guerra”. Diante do quadro atual, é fundamental que a polícia atue priorizando a inteligência, a estratégia e, sobretudo, a valorização da vida de toda a população, sem exceção.

A sensação de insegurança generalizada tem provocado um clamor, por parte de diversos setores sociais, por intervenções duras das forças policiais. Parte da população espera inclusive que a polícia entre nas favelas para matar. O risco que corremos diante desse quadro é o da legitimação social de práticas como o uso abusivo da força, execuções sumárias e outras formas de violações de direitos.

O número de mortes registrado nos últimos dias e o uso ostensivo de equipamentos bélicos aponta para um panorama extremamente preocupante. A letalidade não pode de forma alguma ser apresentada como critério de eficiência da atuação policial, nem como “dano colateral” de uma operação. Nada justifica a perda de vidas em uma intervenção do Estado. Não podemos ver a repetição de ações como a ocorrida em junho de 2007, na operação que ficou conhecida como “Chacina do Alemão”. Na ocasião, 19 pessoas morreram, muitas com indícios de execuções sumárias.

Em um momento como este, os moradores das áreas atingidas pela atuação das forças de segurança sofrem uma série de violações de direitos. Têm cerceados direitos fundamentais como o de ir e vir e o acesso às escolas, por exemplo. .

É imprescindível que a ação do Estado tenha como foco a garantia da segurança e a proteção da vida dos moradores de todas as áreas da cidade. Infelizmente, o que presenciamos é que os efeitos da violência atingem de forma mais contundente a população que reside nas áreas mais pobres da cidade, o que tem sido um traço histórico das operações policiais realizadas no Rio de Janeiro. E isso tem que acabar.

Publicado originalmente no site do Observatório de Favelas

sexta-feira, novembro 26, 2010

A Batalha do Rio (Algumas Reflexões)

Envio abaixo três artigos:

1) Rio: onda de ataques já atingiu finalidade, de Wálter Maierovitch
2) A Batalha do Rio, de Mauro Santayana;
3) O "bonde do Nem" e a impunidade da cartolagem tem muito em comum, de Lucio de Castro.

As duas primeiras foram produzidas depois dos recentes ataques no Rio de Janeiro, a terceira no caso do sequestro do hotel em São Conrado. A análise das três merecem atenção e devem nos levar a reflexão. O fato é que o tráfico de drogas (e armas), seja aqui, na Colômbia, no México ou na Itália, existe em acordo com o Estado, ou de quem governa.

Neste sentido vamos analisar:
1) a ocupação pelas UPP's não tem como objetivo acabar com o tráfico de drogas;
2) a grande possibilidade do governo do Estado do Rio ter feito um acordo com a Facção ADA (lembre-se que em 2006 o governo de São Paulo fez acordo com o PCC);
3) a maioria das UPP's estão sendo instaladas em favelas do Comando Vermelho e em áreas da cidade que estão sendo preparadas, ou são rotas de passagem, para os mega-eventos esportivos;
4) ou seja, as empresas ligadas a especulação imobiliária são as grandes benefíciárias;
5) em áreas das UPP's instalaram cursos para trabalhos precários nesses mega-eventos;
6) o governo do Estado só ataca o varejo do tráfico;
7) os principais mortos e feridos, até aqui, são trabalhadores das áres de ação da polícia (Vila Cruzeiro, Jacarezinho).
8) Outro ponto interessante foi a ação da marinha com comandantes vindos do HAITI.

Nesta terceira reportagem fica claro os acordos entre a ADA e o governo. Já o primeiro artigo fala de uma possível associação entre CV e ADA, o que acho difícil. Particularmente, acredito que como o governo Mexicano de Calderon, o governo do Estado tenha tomado lado na "guerra". Haverá no tráfico de drogas uma mudança de como faze-lo. A pergunta é, como fica o tráfico de armas? Quem efetivamente controla? Pode ter sido uma resposta do CV ao governo, que gerou um "efeito curinga", ou seja, o caos, o que o primeiro texto também fala um pouco. Mas por outro lado, isso gerou uma justificativa para fazer uma operação de guerra na Favela, lotando o Hospital Getúlio Vargas, na Penha, de trabalhadores atingidos pelas balas achadas, que só acha preto, pobre, trabalhador e morador de favela.

A mídia, como sempre, faz seu espetáculo.

No mais, é refletir

"Pois paz sem voz, paz sem voz
Não é paz, é medo!"

valeu,
Rômulo

TODO PODER AO POVO!
ABAIXO AO ESTADO E O CAPITAL!

Rio: onda de ataques já atingiu finalidade

Wálter Maierovitch 25 de novembro de 2010 às 16:45h www.cartacapital.com.br

Tendência dos ataques do crime organizado é submergir para voltar a surpreender. Por Wálter Maierovitch. Foto: AFP

Rio de Janeiro. Primeira onda de ataques do crime organizado já atingiu finalidade. Tendência é submergir para voltar a surpreender

Como se sabe, o crime organizado especial, quer pelas associações mafiosas quer pelas organizações terroristas, busca difundir o medo na população. E realiza isso por meio de ações espetaculares.

No Rio de Janeiro, as associações delinquenciais de matriz mafiosa formaram, com a união de facções e milícias, uma “confederação criminal” para agir em represália à expansão das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) e resolveram exibir os músculos. Essa confederação criminal é formada pelo Comando Vermelho (CV), Amigos dos Amigos (ADA) e Milícias ( organização paramilitar).

Internacionalmente, a mais conhecida formação em “confederação criminal” (quando facções rivais se unem e promovem, nos centros de grande concentração urbana, ações contra as forças de ordem e a população) é a Camorra campana (região meridional da Campânia).

A Camorra é formada por uma miríade de facções que levam o nome dos locais onde controlam territórios e a comunidade (Casal di Principe = Camorra casalese). Esse tipo de organização não tem órgão de cúpula, de governo: são
horizontalizadas, independentes. Mas, os capi (líderes das facções independentes) se unem em confederação quando querem atacar o Estado e aterrorizar os cidadãos.

Em Nápoles, a Camorra controla os populosos bairros de Scampia e Secongiliano. Nessas ações difusoras de temor, o crime organizado procura sempre exibir um “cadáver excelente” (cadaveri eccelenti). A expressão foi usada pelo saudoso escritor siciliano Leonardo Sciascia. No Rio de Janeiro já existe um “cadáver excelente”, o crime organizado matou um jovem inocente, de 14 anos.

A tática empregada é a de guerrilha urbana, que se caracteriza por ataques surpreendentes, num espaço amplo, a abranger regiões norte, sul, leste e oeste.

A confederação criminal fluminense emprega método terrorista, mas não se confunde com as organizações terroristas, cuja ideologia não é o lucro. E a violência eversiva, como sucede com a Al-Qaeda, tem escopo político de desestabilização transnacional.

No Rio de Janeiro, por ordem de líderes não devidamente isolados em presídios de segurança máxima, as ações em curso, como destacado acima, são em represália à política de implantação de Unidades de Polícia Pacificadora
(UPPs). As retomadas de territórios e do controle social pelo Estado abalaram e desfalcaram financeiramente as facções criminosas, quer do Comando Vermelho (CV), quer dos Amigos dos Amigos (ADA).

Como se sabe, ocorreram deslocamentos de várias facções para o Complexo do Alemão e para Vila Cruzeiro. Economicamente, os membros das facções instaladas no Complexo do Alemão e em Vila Cruzeiro passaram a ter a
concorrência dos migrantes.

Nenhuma organização pré-mafiosa ou mafiosa, como Comando Vermelho, Primeiro Comando de São Paulo, Amigos dos Amigos, Camorra, ‘Ndrangheta, Cosa Nostra, Sacra Corona Unita, Tríades Chinesas, Lobos Cinzas turcos etc, consegue,
dada a reação dos Estados, manter permanentes ataques.

Como regra, as organizações criminosas pré-mafiosas, logo depois de uma série de coordenados ataques espetaculares costumam submergir, mergulhar.

A prática comum é mergulhar e fingirem-se de vencidos. Isto até que o Estado saia da “prontidão” e os cidadãos voltem à rotina. Depois desse relaxamento das forças de ordem, o crime organizado sempre volta a atacar.
Salvo se as metas forem atingidas: em São Paulo, nos mais de 200 ataques do PCC ocorridos a partir de maio de 2006, houve um acordo espúrio com os órgão governamentais de segurança pública.

PANO RÁPIDO. Espera-se que o governo do Rio não negocie com a criminalidade e agilize a implantação das UPPs.

Wálter Maierovitch

Walter Maierovitch é jurista e professor, foi desembargador no TJ-SP


A Batalha do Rio

Mauro Santayana (http://www.jblog.com.br/politica.php?itemid=24740)

É UM ENGANO identificar a batalha do Rio - de outras grandes cidades - como mero confronto entre a polícia e de­linquentes, traficantes, ou nâo.Embora a conclusão posssa chocar os bons sentimentos burgueses, e excitar a ira con­servadora, é melhor entender os arrastões, a queima de veí­culos, os ataquesa tiros contra alvos policiais, como atos de insurreição social. Durante a re­belião de Sào Paulo, o gover­nador em exercício, Cláudio Lembo, considerado um polí­tico conservador, mais do que tocar na ferida, cravou-lhe o dedo, ao recomendar à elite branca que abrisse a bolsa e se desfizesse dos anéis.

O Brasil é dos países mais desiguais do mundo. Estamos cansados do diagnóstico estatístico, das análises acadêmi­cas e dos discursos demagógi­cos. Grande parcela das camadas dirigentes da socieda­de não parece interessada em resolver o problema, ou seja, em trocar o egoísmo e o preconceito contra os pobres, pe­la prosperidade nacional, pe­la paz, em casa e nas ruas. Não conseguimos, até hoje (em­bora,do ponto de vista da lei, tenhamos avançado um pou­co, nos últimos decénios) re­conhecer a dignidade de to­dos os brasileiros, e promover a integração social dos mar­ginalizados.

"Arrastões, queima de veículos, ataques a tiros contra alvos policiais são atos de insurreição social".

Os atuais estudiosos da Es­cola de Frankfurt propõem ou­tra motivação para a revolu­ção: o reconhecimento social. Enfim, trata-se da aceitação do direito de todos participa­rem da sociedade econômica e cultural de nosso tempo. O li­vro de Áxel Honneth, atual di­rigente daquele grupo {A luta pelo reconhecimento. Para uma gramática moral do conflito so­cial) tem o mérito de se con­centrar sobre o maior proble­ma ético da sociedade contemporânea. O do reconhecimento de qualquer ser humano como cidadão.

A tese não é nova, mas atualíssima. Santo Tomás de Aquino foi radical, ao afirmar que sem o mínimo de bens materiais, os homens estão dispensados do exercício da virtude.


Quem já passou fome sabe que o mais terrível dessa situação é o sentimento de raiva, de im­potência, da indignidade de não conseguir prover com seus braços o alimento do próprio corpo. Quem não come, não faz parte da comunidade da vida. E ainda "há outras fo­mes, e outros alimentos", co­mo dizia Drummond.

É o que ocorre com grande parte da população brasilei­ra, sobretudo no Rio. em São Paulo, no Recife, em Salvador,enfim, em todas as gran­des metrópoles. Mesmo que comam, não se sentem inte­grados na sociedade nacio­nal.


Falta-lhes outro alimento. Os ricos e os integrantes da alta classe média, que os humilham, a bordo de seus automóveis e mansões, são vistos como estrangeiros, se­nhores de um território ocu­pado. Quando bandos come­tem os crimes que conhece­mos (e são realmente crimes contra todos), dizem com as labaredas que tremulam co­mo flâmulas: "Ouçam e ve­jam, nós existimos".

As autoridades policiais atuam como forças de repres­são, e não sabem atuar de ou­tra forma, apesar do emplas­tro das UPPs.

Na Europa, conforme os analistas, cresce a sensação de que quem controla o Estado e a so­ciedade não são os políticos nem os partidos, escolhidos pelo voto, mas, sim, o mercado.


Em nosso tempo, quem diz "mercado", diz bancos, diz banqueiros, que dominam tu­do, das universidades à grande parte da mídia, das indústrias aos bailes funk,! E quando frau­dam seus balanços e "que­bram", o povo paga: na Irlan­da, além das demissões em massa, haverá a redução de 10% nas pensões e no salário mínimo - entre outras medi­das - para salvar o sistema.

Quando bandos cometem os crimes é como se quisessem dizer "Ouçam e vejam, nós existimos".

A diferença entre o que ocorre no Rio e em Paris e Londres é que, lá, o comando das manifes­tações é compartido entre os trabalhadores e setores da classe média, bem informados e ins­truídos.

Aqui, os incêndios de automóveis e os ataques à po­lícia são realizados pelos mar­ginalizados de tudo, até mesmo do respeito à vida. À própria vi­da e à vida dos outros.



23Ago de 2010

O "bonde do Nem" e a impunidade da cartolagem tem muito em comum

por Lúcio de Castro (www.espn.com.br)



“Polícia é polícia, bandido é bandido. Não devem se misturar, igual água e azeite.”

Lúcio Flávio Vilar Lírio - bandido.

Foi uma comoção na cidade. Nacional. Mundial. As notícias não eram justas com o lindo sábado carioca. O bonde do Nem foi interceptado entre o Vidigal e a Rocinha e o coro comeu. Balas zuniam pra tudo que é lado. Cabul parecia uma Disneylândia perto de São Conrado.

Virar um circo online foi questão de segundos na era digital. Natural, a notícia se impunha. Vídeos aparecem de tudo que é lado, entrevistas com vítimas, o papel patético de repórteres de colete à prova de bala falando na tv depois da guerra acabada para dar tom forte ao circo, e agora, no jornal local do Rio, ainda tem “comentarista de violência”.

Isso é bom demais! Não digo que esteja errado, de forma alguma. Mas que é engraçado quando convocado, me permitam achar. No Brasil tem comentarista de futebol, de vôlei, de basquete e de ...Violência! “Agora, o comentarista de violência, fulano...”.

E o sujeito é ferrabrás, ex-comandante do BOPE. Com o tempo vai se sofisticar, melhorar ainda mais, pincelar seus comentários com um scout, táticas, esquemas. Já imaginou quando chegar lá: “Foram 288 balas em 12 minutos de combate. Desde 2004 não existia conflito tão acirrado. Os bandidos atacaram em um 4-2-3-1, e a polícia começou num 3-5-2, passando para um 4-4-2 na metade do conflito. “ Senti falta do Amarelinho da Globo: “fulano foi colhido no tiroteio, e encontrado com o corpo crrrrivado de balas. Ás 11h já era cadáver”.

Não resisti ao desvio da razão inicial do texto, mas é que beira a comédia em alguns momentos. Ao longo do dia, o secretário de segurança deu várias entrevistas. Elogiava a polícia, seus comandados, sem parar. A valentia, a determinação e a tática, utilizada, que deu no que deu, mas ele era só elogios. O governador também. O comentarista de violência (!) estava meio pasmo sem saber como analisar tal conflito. Porque não tinha explicação, tudo bem arregado, as duas favelas sob a mesma facção, por que diabos o tal conflito?

Para quem não é do Rio, vale a explicação: Vidigal e Rocinha são favelas vizinhas, muito próximas, em área nobre. Pelo alto do morro, se encontram por uma floresta. Por baixo, é preciso pegar o asfalto. Sem trânsito, são 5 minutos entre uma e outra.

Antes, cada uma tinha uma facção de tráfico. Viviam em guerra. Sem capacidade ou vontade de acabar com aquela mina de ouro, o estado, invisivelmente, “adorou” quando todas as condições foram criadas para que uma facção dominasse a outra e os dois morros ficassem unificados na mesma sigla criminosa. Curiosamente foram expulsos os da facção que tem merecido mais UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora) nas favelas que dominam, e sido varridos pra baixo do tapete para o Complexo do Alemão. A velha lógica de limpar áreas mais nobres e mandar o resto pra periferia. Como nos anos 60, aquela estratégia que já tratamos aqui, que um dia dá m...

E assim vamos levando, tudo num grande acordão. Quem está fora da lei vai para baixo do tapete e segue vivendo em paz na periferia, como vimos outro dia em vídeo, assassinos do Tim Lopes livres, ostentando metralhadoras. Outro acordão silencioso unifica Vidigal e Rocinha numa facção só, e assim todo mundo vai levando. Sem guerra, sem incomodar a zona sul da cidade, que sobe a colina para consumir drogas e garantir os milhões faturados mensalmente naquelas favelas. Será que ficam apenas ali aqueles milhões? Por que não teve UPP ali ainda?

De repente, essa paz artificial é rompida. Mil explicações, análises. E de repente, no fim do sábado, os grandes repórteres do Globo, Antonio Werneck e Vera Torres, com caixa e rodagem, anos nessa estrada, cascudos, publicam a notícia, essa sim devastadora, que enfim explicava o tal conflito no meio da paz arrumada: uma “operação não autorizada da PM, sem o aval do comando”, fez com que homens da polícia tentassem surpreender o chefão do tráfico Nem, que ia do Vidigal para a Rocinha, como faz todas as sextas-feiras, segundo relatos, saindo do baile e indo pacificamente dormir com os anjos na Rocinha. Nunca encontrou blitz, operação...Misteriosamente, dessa vez, deu-se o fuzuê. Algo aconteceu de diferente...Espetacular apuração da dupla.

Para quem não é acostumado com o linguajar jornalístico policial, “operação não autorizada da PM, sem o aval do comando” é sinônimo de mineiragem. Para quem não está acostumado com o linguajar jornalístico policial, mineiragem é extorsão de dinheiro. São vários os relatos de “operação não autorizada da PM, sem o aval do comando” em que bandidos são sequestrados pela polícia, “não oficialmente” (!), e tem que pagar um preço para não ir pro xilindró.

Um chefe de tráfico caindo nas garras de policiais que queiram mineirar vale alguns milhões. Como o tráfico é negócio de alta liquidez, prende-se aqui, extorque-se dinheiro ali, e em poucos minutos estão levantados milhões, em dinheiro puro, nota sobre nota. È o arrego, na gíria policial. Ninguém fica sabendo, o sujeito volta pro lar e pra sua atividade. E todos dormem em paz, e a sociedade fica crendo na pacificação, e etc, etc...

No fatídico sábado algo fugiu ao controle. Quando isso acontece, a sociedade fica sabendo. Só assim. Acordos inescrupulosos acontecem em diversos setores da nossa sociedade, nos mais altos inclusive, todos os dias. Não só na polícia militar, mas como em setores da justiça, das entidades de controle que a sociedade dispõe, demais policias, congresso, senado...Vez por outra a mineiração do bonde dá errado, o mensalão foge ao controle, uma ex-mulher de sócio do cartola abre o bico...

Mas no Brasil existem diversos bondes do Nem. Na maior parte das vezes, dá certo a mineiração. Por vezes, algo foge ao controle.

Temos diversos exemplos. Tragicamente, bem recentemente, um policial ia livrar a cara de um assassino mineirando o pai do cara que matou o filho da atriz Cissa Guimarães. Como fazem no bonde.

Em Brasília, o sujeito é preso com dinheiro na cueca, mineirado. Como no bonde do Nem. E agora me digam: alguém tem dúvida de que nossos cartolas e suas tenebrosas transações são monitorados e investigados em “operação não autorizada, sem o aval do comando”, e tem enriquecimento ilícito registrados e observados por Congresso, MP, PF, COAF, Ministério da Justiça, Fazenda...

Tem muita gente por aí que sabe tudo o que determinados cartolas fazem, como enriquecem, documentação...Por favor...Mas a mesma lógica que faz com que o bonde do Nem passe toda sexta entre o Vidigal e a Rocinha sem problemas, salvo em sextas em que algo foge ao script, de acordo com a espetacular apuração da dupla do Globo, faz com que cartolas sigam flanando por aí, posando de gestores e empreendedores, capazes de grandes conquistas para o Brasil e de grandes eventos. É o arrego, na gíria policial.

Salvo quando algo ou alguém foge ao script. Hoje, nossa polícia federal é extremamente competente nas investigações. Ministérios capazes de produzir refinados dossiês, como vemos toda hora. Instituições de fiscalização financeira evoluídas. Não tenha dúvidas: se nenhum dos nossos cartolas ou dirigentes de entidades do esporte é surpreendido por operação policial numa van voltando do baile, é porque realmente no Brasil corre um grande bonde do Nem. Só chega do Vidigal para a Rocinha com a cumplicidade de gente grande.


segunda-feira, novembro 08, 2010

FRANÇA - Mobilizações Não Param!!!!

As mobilizações na França não cessaram. No último sábado aconteceram novas mobilizações que levaram as ruas mais de 1 milhão de trabalhadores e estudantes. Neste momento há uma negociação entre as centrais sindicais para discutir os caminhos a serem tomados, um setor defende a radicalização das lutas, entre elas a FO, a CGT e os Solidários, ainda que os dois últimos estejam negociando com outras centrais, ao contrário da FO.
A vitória dos trabalhadores franceses pode significar o inicio de um ciclo de luta em favor do povo. Vamos ver os desdobramentos dessa luta, se também não gerará mais organização.

segunda-feira, outubro 25, 2010

França: a luta continua






























Tem uma Greve marcada para o dia 28/10 e dia 06/11. Datas de reunião dos próximos trâmites burocráticos da reforma. O destaque do Le Monde era a ação de P2 nas manifestações, que são chamados pela imprensa de "policiers casseurs" ou simplesmente "casseurs". Casseurs significa bandido.

O interessante é a organização dos estudantes em sindicatos. São vários pelo visto. A Federação Independentes e Democrática de Secundáristas (FIDL) - www.fidel.org, a União Nacional de Secundaristas (UNL) - www.unl-fr.org, a União Nacional de Estudantes Franceses (UNEF) - www.unef.fr e a Federação dos Sindicatos de Estudantes da SUD, vinculada a central "Solidários" (www.sud-etudiant.org).




Retraites: cheminots, lycéens et éboueurs toujours sur le pont


Aposentadoria: ferroviários, secundaristas e lixeiros todos sobre a ponte.


Une France jeune qui se lève tôt

Uma França jovem que se eleva também

Reportage

De l’aube à la fin de la manif, entre vote sur le blocage et provocations des casseurs, une journée avec des lycéens de parisiens.

Do inico ao fim da manifestação , entre o voto sobre o bloqueio e provocação dos , uma jornada com os secundaristas parisienses.

Réagir

Par ONDINE MILLOT

Les premiers étaient là dès 6 h 30 pour installer barrières et banderoles. La plus grande, déployée sur la grille du lycée, est celle «qui résume le mieux», disent-ils : «13 ans en taule (juridiquement), 16 ans pas responsables (politiquement), 25 ans au chômage, 70 ans mort au taf.» A

e Monde.fr:

(AFP) Des manifestants hostiles à la réforme des retraites ont bloqué pendant quelques heures mercredi matin le dépôt pétrolier Total de Brive-la-Gaillarde (Corrèze), a-t-on appris de sources policière et syndicale.

Os primeiros foram as 6:30 para instalar barreiras e bandeiras. A maior, implantado no portão da escola, é o que melhor resume, dizem-nos: “ 13 anos de xadrez (juridacamente), 16 não responsáveis (politicamente), 25 no desemprego, 70 anos morte ou “taf”.



l'Unef, premier syndicat étudiant



Au dépôt de carburant de Donges, les grévistes "ne lâchent pas le combat"

LEMONDE pour Le Monde.fr | 20.10.10 | 13h48


“No depósito de combustível de Donges, os grevistas “não cederemos o combate”



A Dunkerque : "Sarkozy veut nous faire crever au boulot"

LEMONDE.FR | 20.10.10 | 15h40 • Mis à jour le 20.10.10 | 15h40

Samuel Laurent / LeMonde.fr

Membres de la CGT, de FO, de SUD ou de la CFDT, les militants syndicaux de Dunkerque ont procédé à une nouvelle matinée d'actions et de blocages.


Membros da CGT, Força Operária, SUD e da CFDT, os militantes sindicais de Dunkerque procedem uma nova manutenção das ações e dos bloqueios.